quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Beleza!




— Beleza! — exclamou o engraxate, sorrindo. Ele acabara de receber uma gorjeta do cliente generoso.
"Beleza" tornou-se hoje uma expressão brasileira popular que manifesta aprovação, verificação de que as coisas estão ocorrendo, enfim, como devem e deveriam sempre ocorrer. Bela expressão também, porque igualmente exata, certeira, adequada e iluminadora foi sua escolha espontânea. E contra a beleza não há argumentos. A beleza é essa luz que jorra de e patenteia uma verdade verdadeira. Luz que nos dá lucidez, clarividência, visão clara e abrangente no claro-escuro e no fragmentário em que nos movemos, aos tropeços. Assim como entender uma piada é um ato intelectual — e o riso é a aprovação de que a piada é boa, de que ela corresponde a um fato dissimulado pela "seriedade", pela minha auto-enganação, pelas formalidades e conveniências sociais —, usufruir da beleza (artística ou da natureza, ou mesmo industrial) é perceber uma realidade amorosa e inteligentemente organizada que se revela.
Rodin é taxativo: "Não há, na realidade, nem estilo belo, nem desenho belo, nem cor bela. Existe apenas uma única beleza, a beleza da verdade que se revela. Quando uma verdade, uma idéia profunda, ou um sentimento forte explode numa obra literária ou artística, é óbvio que o estilo, a cor e o desenho são excelentes. Mas eles só possuem essa qualidade pelo reflexo da verdade."
A beleza é uma luz que emana da realidade e nos avisa: ultrapassamos (pelo menos por um momento) o contato banalizante e desumanizante com a vida. Mostra-se-nos que há, no núcleo da realidade, um ato de amor que põe as coisas no seu devido lugar — a gorjeta que surpreende, ultra-justiça, graça, gratuidade.
Essa auto-revelação da vida expande nossa sensibilidade, nossa inteligência, nossa capacidade de amar e de sofrer, de aprender (sabedoria) que também é uma grande lição não entender o mistério, não querer esgotar a inesgotabilidade da realidade. Não esgotá-la, mas por ela ser invadido.
No outro extremo, não enxergar a beleza é não ver o ser, é des-ver a visão. Quando Michel Foucault dizia sentir uma incompatibilidade fundamental entre ele e a realidade, confidenciava também sua limitação estética, e filosófica, a despeito de sua respeitável erudição.
Quando Sartre, lembrando-se de que Flaubert pedira a Maupassant que se pusesse diante de uma árvore a fim de descrevê-la, considerava o tal conselho absurdo e dizia que Maupassant poderia, no máximo, tomar as medidas do objeto, dado que a árvore sempre lhe negaria o seu sentido, o seu ser — Sartre mostrava-se aqui menos artista do que de fato era. Menos vidente.
Novamente Rodin: "Mesmo no sofrimento, mesmo na morte de entes queridos e até mesmo na traição de um amigo, o grande artista — e estou me referindo ao poeta, assim como ao pintor ou escultor — encontra a voluptuosidade trágica da admiração."
A beleza é a luz que se projeta quando se opera um contato orgânico, vivo, entre o eu e o outro, entre o homem e o mundo, entre o mundo e o divino. Quando se descobre a organização profunda, a união harmoniosa e equilibrada das diferenças, a união entre o sensível e o meta-sensível, o diálogo entre o certo e o errado, entre o amor e o ódio, entre o tudo e o nada: mostrando o sentido que há nisso tudo, o lugar que tudo isso ocupa na ordem geral do ser.
Splendor ordinis, antiga definição de beleza, é o brilho intenso que emana da ordem, ordem no sentido de um campo de harmonização das coisas contrárias. Ordem, etimologicamente, refere-se a urdir. Ordenar é urdir, tecer, tramar, entrelaçar, estruturar. A teia da aranha, bem ordenada, simétrica, inteligente, obediente e improvisadora, ordem frágil mas eficiente, é bem esse texto forte e delicado, belo e terrível, em que as realidades da vida e da morte se entrelaçam harmoniosamente. Aliás, a poeta norte-americana Emily Dickinson comparava a obra do artista com a teia da aranha. E o leitor, ao apreender a urdidura (e nela ser apreendido), vê a ordem implícita do real, na beleza.
Privar-nos da beleza é um enterrar-se vivo. É negar nossa própria capacidade de transcendência e de encontro com o Todo.


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*Texto de______________ Gabriel Perissé

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*Nas fotos_____Eu____Hugo de Oliveira

12 comentários:

Débora Cunha disse...

meu maior amor é a beleza, interior e exterior

especialmente, a beleza dos mundos interiores subjetivos

Bandys disse...

Hugo
A beleza esta na maneira como vc é.
Adorei sua visita e comentario...dizem que as lagrimas é o arco-iris dos olhos.

beijos

PS Eu tambem gosto de te ler. rsrs

Serginho Tavares disse...

lindo texto como sempre e lindas fotos
valeu por sempre passar no meu blog
beijoooooooooooooooooos

[Farelos e Sílabas] disse...

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Por isso afirmo que a beleza é a essência a qual poucos vêem.

Como assim? - perguntarão os desavisados.

Faço das palavras de Saint-Exupéry as minhas: "porque o essencial é invisível aos olhos... só se vê bem com o coração!"

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RENATA CORDEIRO disse...

"Toda beleza é uma promessa de felicidade", escreveu Stendhal, no seu livro Do Amor. E concordo com ele. Já o texto do Perissé, que conheço, achei muito longo, cheio de citações para mostrar erudição e pernóstico. Desculpe-me, Hugo, mas essa é a minha opinião. Porque não escreveu você um texto sobre a beleza? Você tem capacidade para tanto, não duvide disso.
Não vai dizer que freqüentou a Escola de escritores? Embuste. Aprenda sozinho. Todo este texto que vc postou não vale a sentença de Stendhal.
Um beijo,
Renata

Fernanda Magalhães disse...

Ès belo garoto, parabéns pela escolha do texto, parabéns pela fotos, estão perfeitas!

Bjos de luz!

Pelos caminhos da vida. disse...

Vc passou para nós a sua beleza.

Bom dia amigo!

beijooo.

Camila disse...

Apesar de não gostar de posts grandes, confesso que gostei por demais deste!
Belo e muito bem escrito, as fotos deram um "tcham" especial!
Liiiindos!
Beijos

Mello disse...

Olá Hugo!

A beleza está na verdade do sentimento. Também concordo, os meus textos têm sempre um fundo de verdade. Podem não sair exactamente como quero, mas dá para desabafar sem sufocar ninguém.
Já te tinha dito que escreves muito bem e que gosto muito de ler-te!?
Ganhei o dia... lindo texto!
Tenho acrescentar que gosto da expressão brasileira, beleza, pois acredito na força dos pensamentos que se exprimem em palavras. Se todos dissermos beleza, é uma palavra positiva que será enviada para o universo e este retribuirá com beleza.

Beijinhos,

Duda Martinez disse...

Delícia!! Parabéns Hugo, você está cada dia melhor!!!
Beijos

bb disse...

Pois é...
Uma festa é uma festa! ;)
e "Beleza" é uma palavra realmente normal hj em dia em q dizemos p/ muitas coisas.. entrou já no NOSSO COTIDIANO. ;)
Abraços..

Adoa Coelho disse...

Concordo!

Quando apercebemos a verdade nas "coisas" relacionamo-nos com elas de uma forma quase incondicional. Vemo-nos nelas e deixamo-nos deslumbrar.

Mas a beleza existindo na verdade, muitas vezes encontra-se também na fealdade. Depende de quem a ve.

Outras vezes para se atingir a verdade... Tem-se de vasculhar em coisas muito feias...