Tudo me cansa, mesmo o que me não cansa. A minha alegria é tão dolorosa como a minha dor. Quem me dera ser uma criança pondo barcos de papel num tanque de quinta, com um dossel rústico de entrelaçamentos de parreira pondo xadrezes de luz e sombra verde nos reflexos sombrios da pouca água.
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Entre mim e a vida há um vidro tênue. Por mais nitidamente que eu veja e compreenda a vida, eu não lhe posso tocar. Raciocinar a minha tristeza? Para quê, se o raciocínio é um esforço? E quem é triste não pode esforçar-se. Nem mesmo abdico daqueles gestos banais da vida de que eu tanto queria abdicar. Abdicar é um esforço, e eu não possuo o de alma com que esforçar-me.
Entre mim e a vida há um vidro tênue. Por mais nitidamente que eu veja e compreenda a vida, eu não lhe posso tocar. Raciocinar a minha tristeza? Para quê, se o raciocínio é um esforço? E quem é triste não pode esforçar-se. Nem mesmo abdico daqueles gestos banais da vida de que eu tanto queria abdicar. Abdicar é um esforço, e eu não possuo o de alma com que esforçar-me.
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Eu não teria o horror à vida como a uma coisa. A noção da vida como um todo não me esmagaria os ombros do pensamento. Os meus sonhos são um refúgio estúpido, como um guarda-chuva contra um raio. Sou tão inerte, tão pobrezinho, tão falho de gestos e de atos. Por mais que por mim me embrenhe, todos os atalhos do meu sonho vão dar a clareiras de angústia. Mesmo eu, o que sonha tanto, tenho intervalos em que o sonho me foge, então as coisas aparecem-me nítidas. Esvai-se a névoa de que me cerco. E todas as arestas visíveis ferem a carne da minha alma. Todas as durezas olhadas me magoam o conhecê-las durezas. Todos os pesos visíveis de objetos me pesam por a alma dentro.
Eu não teria o horror à vida como a uma coisa. A noção da vida como um todo não me esmagaria os ombros do pensamento. Os meus sonhos são um refúgio estúpido, como um guarda-chuva contra um raio. Sou tão inerte, tão pobrezinho, tão falho de gestos e de atos. Por mais que por mim me embrenhe, todos os atalhos do meu sonho vão dar a clareiras de angústia. Mesmo eu, o que sonha tanto, tenho intervalos em que o sonho me foge, então as coisas aparecem-me nítidas. Esvai-se a névoa de que me cerco. E todas as arestas visíveis ferem a carne da minha alma. Todas as durezas olhadas me magoam o conhecê-las durezas. Todos os pesos visíveis de objetos me pesam por a alma dentro.
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A minha vida é como se me batessem com ela.
A minha vida é como se me batessem com ela.
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[Fernando Pessoa]
12 comentários:
Fernando Pessoa é um génio!
Até ele as vezes sentia-se vitima da tristeza. Ninguém está livre de ter uma fase ruim. Ainda bem que tudo passa,a gente cresce e vira o jogo sempre. Um lindo texto sem dúvida. Montão de bjs e abraços
Desejo-lhe um final de semana bem descansado amigo.
Gde Fernando Pessoa.
beijooo.
Belissimo post amigo,,,abraços fraternos de otimo final de semana pra ti.
Triste... mas lindo. Um abraço
Você foi citado no meu blog
"Mesmo eu, o que sonha tanto, tenho intervalos em que o sonho me foge, então as coisas aparecem-me nítidas." A percepção crítica e sensível de Pessoa me encanta ... fantástico mesmo esta sua postagem deste momento da obra dele ...
bjux querido ...
ps: ilustração magnificamente bela
;-)
Fernando Pessoa é mágico. Sabe ser triste mas sempre maravihoso ao mesmo tempo.
Beijos querido
triste...triste...triste...
só quero um sorriso seu...
beijos com muito carinho,
Bia
Nada como os olhos de um poeta como Pessoa para enxergar situações tão corriqueiras como algo especial... e além de enxergar traduzir tão bem em palavras. Amei o trechinho que diz assim:
"Entre mim e a vida há um vidro tênue. Por mais nitidamente que eu veja e compreenda a vida, eu não lhe posso tocar. "
Obrigada por partilhar tanta beleza!
Bjs. e bom final de semana!
Oi Hugo!
Esse eu nunca tinha lido...lindo!
Bom fim de semana!
Belo texto e imagem. Amei
Bjux
"Abdicar é um esforço, e eu não possuo o de alma com que esforçar-me."
declarar a vida assim em tom maior, destreza de poucos, sabedoria de anos e anos a fio...
um beijo,
e saudades de você
estou voltando aos poucos
e nossa amizade é boa!
fica com Deus!
do menino-homem
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